A Apple realmente depende tanto assim da China? A resposta é sim — e muito. Com mais de 80% de seus principais fornecedores com fábricas no país (inclusive gigantes como Foxconn e Luxshare), a empresa construiu ao longo de décadas uma complexa cadeia de fornecimento que abastece iPhones, iPads, Macs e AirPods. Esse ecossistema, concentrado em centros industriais como Shenzhen e Zhengzhou (“a cidade do iPhone”), garante eficiência excepcional, escala e custos baixos — fatores praticamente impossíveis de replicar em outros mercados.
Essa dependência, no entanto, traz riscos crescentes. Sob estilo geopolítico de “dupla circulação”, a China tem investido em promover fornecedores locais e reduzir vulnerabilidades externas.
Ao mesmo tempo, tensões comerciais com os Estados Unidos levaram a tarifas ameaçadoras e exigências de produção local, pressionando a Apple a repensar sua estratégia.
A Apple tem respondido acelerando sua diversificação em países como Índia, Vietnã e até Estados Unidos, com montadoras indianas já enviando 97% dos iPhones fabricados no país para o mercado americano — resultando em US$ 3,2 bilhões em exportações entre março e maio de 2025.

Ainda assim, replicar a escala e eficiência da China é uma tarefa hercúlea. Parcerias em tecnologia de ponta, clusters industriais que se retroalimentam e mão de obra amplamente treinada continuam concentrados por lá. Tanto que, mesmo investindo cerca de US$ 16 bilhões desde 2018 na realocação da cadeia, apenas 14% da produção de iPhones estava na Índia em abril de 2024 — e mesmo assim há forte presença chinesa em fornecedores de Vietnã e Tailândia.
Essa dependência colocou a Apple numa encruzilhada: manter a presença na China é vital para lucratividade, mas arrisca sua segurança operacional e liberdade estratégica. De acordo com o Financial Times, Tim Cook enfrenta o dilema de navegar entre manter a operação eficiente e lucrativa em solo chinês e satisfazer as pressões políticas por produção doméstica . A Apple passou mais de US$ 275 bilhões no país, treinou milhões de trabalhadores e contribuiu com cerca de US$ 55 bilhões anuais para a economia local — em troca, ajudou a elevar gigantes chineses como Huawei e Xiaomi.

A China também depende da Apple? Em boa parte sim. A empresa é responsável por milhões de empregos nas fábricas, e suas operações beneficiam clusters inteiros de fornecedores, centros de P&D e infraestrutura. Além disso, o crescimento da Apple ali impulsiona a modernização industrial, gera dividendos fiscais e reforça a imagem do país em inovação tecnológica.
Para reduzir essa dependência, a Apple tem ampliado sua presença no exterior: fortaleceu centros de P&D na Índia, Vietnã, Singapura e até EUA; investiu em automação e robótica para flexibilizar produção . Projetos ambiciosos, como transferir toda a produção para o mercado americano até 2026 estão em estudo, embora analistas advirtam que será financeiramente inviável . A chave, segundo especialistas, é uma estratégia gradual de manter a China como pilar, mas deslocar 30 a 40 % da produção para outras regiões até 2027/28.
Em resumo, a Apple e a China vivem uma relação de interdependência profunda. A empresa explorou ao máximo a infraestrutura chinesa para crescer e inovar, mas agora paga o preço de uma cadeia vulnerável a riscos geopolíticos e de mercado. Ao avançar com modelos de produção distribuída em locais como Índia e Vietnã, a Apple busca se afastar gradualmente dessa dependência. Ainda assim, a China continua sendo seu coração industrial — e um parceiro inevitável no futuro previsível.